Em um tempo longínquo, quando o mundo se movia ao ritmo cadenciado das máquinas de ferro, um homem visionário, Henry Ford, ergueu-se como um titã no universo automobilístico dos Estados Unidos. Mas, este não é um conto sobre rodas de aço e motores vorazes. É a história do dia em que Ford ousou sonhar, e sua audácia o trouxe até a Amazônia, um paraíso de exuberância e segredos ainda não revelados.

Ford, o industrial do coração incansável, proclamou certa vez: “Sem os pisantes emborrachados, meus carangos não andam”. Com essa visão, ele aportou em terras brasileiras, trazendo consigo grandes navios carregados de máquinas jamais vistas por aquelas paragens. No rastro de sua jornada, acompanhavam-no homens de corações diversos, alguns compassivos e outros rudes. Talvez tenha sido essa diversidade que, há 95 anos, o levou à falência em solo amazônico.

Os bons chefes acordavam antes da aurora, ao romper das 4h da manhã, para receber os humildes homens vindos do Nordeste do Brasil, em busca de oportunidades. Esposas e filhos desses bravos trabalhadores acampavam na vastidão da floresta úmida, ansiando pelo sucesso de seus patriarcas. Famílias inteiras deixavam para trás suas terras e passados de sofrimento em busca de um futuro melhor nas terras do Pará. “Todos registrados, agora é hora de plantar para colher”, dizia um americano visionário!

Alguns chegavam atrasados nesse espetáculo da Amazônia e tentavam erigir bares e prostíbulos nas cercanias daquele paraíso industrial. Mas Ford não estava disposto a deixar sua visão se perder. Ele bradou: “Acabem com isso, vamos trabalhar, apenas trabalhar.” E ali, no seio de uma floresta onde árvores grandiosas eram sacrificadas para que homens da borracha encham suas latas com o precioso látex, florescia um “paraíso” de salários.

Alguns chefes, a quem a arremessa maior era confiada, desviavam parte dos honorários dos trabalhadores, privando-os do fruto de seu esforço. E como não se enfurecer diante disso? A ira fervia nos corações dos balateiros, e eu também me sentia indignado!

Um dia, sob o sol a pino, Henry Ford decretou um almoço, servindo a todos hambúrgueres, um sabor estranho àqueles homens da floresta. Eles ansiavam por pratos brasileiros e peixes frescos do rio Tapajós. Quando a senhora Joana, com seu jeito materno, começou a servir a comida de Fordlândia, uma revolta fervilhou. “Matem todos os americanos!”, ecoou a voz de um trabalhador da primeira fila.

A imprensa e os críticos podem rotular este lugar como fantasmagórico, mas aqui, na sombra das árvores centenárias, a gratidão a Henry Ford é um sentimento que perdura. Foi ele que presenteou esta terra com o primeiro hospital equipado com tecnologia de ponta no Brasil, e aqui, sob a vastidão verde da floresta, realizou-se a primeira cirurgia de pele do mundo.

Henry Ford legou ao Brasil dois tesouros, duas jóias em meio à selva inexplorada: Fordlândia e Belterra. Nessas terras, trabalhadores aposentados ainda sussurram as histórias de suas vidas, como se esses tempos fossem as melhores páginas de seus dias. Amazônia, a terra de Henry Ford, permanece viva no coração da história e na memória daqueles que ousaram sonhar, mesmo sob as sombras da floresta.

Neste rincão remoto, onde a Amazônia se confunde com a ousadia de um industrial, encontramos uma história que ecoa além do tempo e do espaço. Um sonho grandioso, que trouxe riqueza e desafios, deixando cicatrizes e memórias profundas nas entranhas dessa selva intransponível.

No ímpeto de uma visão visionária, Henry Ford esculpiu sua marca neste cenário tão exuberante quanto inóspito. O choque de culturas, a luta pelo trabalho e a resistência humana sob a opressão foram pincelados nessa tela da vida, onde cores vibrantes e sombras profundas se entrelaçaram.

Hoje, à sombra das árvores centenárias e ao som do canto dos pássaros, Fordlândia e Belterra descansam em silêncio, testemunhas do passado. Esta história nos recorda que a busca por progresso e prosperidade pode vir acompanhada de sacrifícios e desafios inimagináveis.

Que possamos, ao refletir sobre as lições que esta história nos oferece, encontrar o equilíbrio entre a ousadia dos sonhos e o respeito à natureza e às culturas que habitam essa terra. A Amazônia, com sua magnificência e desafios, nos lembra que devemos ser guardiões de sua beleza e dos sonhos que ousam florescer sob seu dossel verde.

Assim, que possamos honrar o legado de Henry Ford, sem nunca ter pisado na sua indústria amazônica, não apenas com gratidão, mas também com o compromisso de preservar esse tesouro natural e cultural, que é a Amazônia, para as gerações vindouras. E que em cada brisa da floresta, possamos sentir o pulsar de uma história única, onde o sonho e a realidade se entrelaçaram, deixando marcas profundas no solo amazônico nos corações dos moradores, já aposentados, que ainda vivem em Belterra e Fordlândia.

Autor: Cristiano Santa Cruz